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#ThrowbackThursday: Os Incríveis

Começando hoje, o #ThrowbackThursday do El Nerdón vai trazer a minha "incrivelmente importante" opinião sobre um filme, CD, série de TV ou livros que já não geram mais tanta discussão assim, mas que sempre vale a pena revisitar, além de ressaltar a importância que a obra teve na minha formação como pessoa irritante e pseudo-intelectual. Tudo isso nas quintas-feiras, claro.



Nessa semana, após assistir "Tomorrowland - Um Lugar Onde Nada é Impossível" e com tempo livre o suficiente para ver os extras do DVD de "Os Incríveis", resolvi rever o filme, coisa que não fazia há um pouco mais de um ano. O filme, que marcou o início da parceria entre o diretor Brad Bird com a Pixar (três anos depois, essa parceria também nos trouxe o incrível "Ratatouille"), também está relacionado, a um nível pessoal, ao começo da formação do moleque que gosta de entrar em sites sobre cinema e deixar marcado no calendário a estreia de um filme esperado por ele. 

Não consigo ter certeza do momento no qual eu, nos meus seis anos de idade, teria encontrado no site da Disney o site oficial desse filme, apenas com uma contagem regressiva para o lançamento do filme. Aquilo chamou a minha atenção e logo eu estava usando a frase "faltam x meses para 'Os Incríveis'" perto do meu padrasto. O mais engraçado é que eu não sabia nada sobre o filme. Não tinha visto o trailer, não conhecia os personagens, até achava que o Omnidroid era uma versão do Dr. Octopus do "Homem-Aranha 2" ao ver o seu boneco do McDonald's (ainda tenho esse boneco, junto ao carro do Sr. Incrível). Eis que, por pura coincidência (ou talvez não), eu estava no shopping com minha mãe e meu padrasto na dia da estreia do filme. Ele, lembrando das vezes nas quais eu falei sobre o longa, decidiu que terminaríamos a noite assistindo ao filme.

Nos meses que vieram a seguir, eu havia virado um completo viciado naquele filme e naqueles personagens. Eu tinha (ainda tenho em algum lugar) os bonecos dos personagens, o álbum de figurinhas, queria sair por aí correndo como o filho hiperativo dos Pêra e adorava desenhar a cena do Sr. Incrível contra o Omnidroid no vulcão (até porque eu só conseguia desenhar aquilo e ainda ter a justificativa de que "era o desenho de uma criança"). Além disso, esse filme foi responsável por começar o meu vício por edições de DVD com mais de um disco e Brad Bird foi um dos primeiros nomes relacionados ao cinema que eu guardei na cabeça, então se hoje sou o moleque insuportável que gosta de ir ao cinema, é tudo culpa das aventuras da família Pêra.



O filme começa com a era de ouro dos super-heróis, mais precisamente na noite do casamento entre o Sr. Incrível e a Mulher-Elástica. Vemos o Sr. Incrível fazendo várias paradas ao longo do caminho ao altar para ajudar pessoas, ações que mais tarde serão responsáveis pela aposentadoria forçada dos super-heróis, que causaram danos aos cofres públicos devido aos processos e revolta dos cidadãos. Quinze anos depois, os super-heróis vivem escondidos entre nós, levando vidas normais, criando famílias, como é o caso do Sr. Incrível, ou melhor, Roberto Pêra, agora um pai de família acima do peso, trabalhando com apólices de seguros, burlando as normas da empresa para de fato ajudar seus clientes. Sua esposa, Helena (a Mulher-Elástica), fica em casa cuidando de seus três filhos, o hiperativo pré-adolescente com super-velocidade, Flecha, a adolescente tímida que é capaz de ficar invisível e criar campos de força, Violeta e o bebê Zezé, que aparentemente não desenvolveu nenhum poder.

É legal ver que, se no começo do longa, o Sr. Incrível é o mais disposto a se acomodar e levar uma vida normal e a Mulher-Elástica é a que defende que não vai se aposentar e deixar o mundo ser salvo pelos homens, esses papeis acabam sendo invertidos, tornando Helena a defensora da ideia de que eles precisam levar uma vida normal e Beto simplesmente não conseguindo funcionar como um cidadão comum, o que já fez a família se mudar bastante e utilizou muitos recursos da ANS (Agência Nacional de Super-Heróis, responsável por manter o anonimato dos heróis) para consertar os danos feitos por ele após a aposentadoria. Helena também é aquela que melhor controla seus poderes, como podemos ver ao final da discussão que tem com Beto após o incêndio, onde ela, podendo facilmente esticar seu braço para desligar uma lâmpada, resolve não economizar o trabalho e anda até o interruptor, sendo que minutos antes, a mesma usou seu poder no calor da discussão para se igualar ao marido.



Outro ponto acertado do filme é o design de produção, principalmente em relação às cores. Se após a entrevista em preto e branco, somos acertados por uma paleta de cores quentes e incrivelmente saturadas, o escritório de Beto é apresentado como um lugar frio e sem cores. Além do desaparecimento das cores, o lugar é apresentado com uma profundidade de campo tão reduzida que provoca a sensação de claustrofobia, fazendo todos no cenário estarem a menos de dois centímetros de distância de qualquer coisa. Ainda nesse assunto, a decisão de fazer o filme em 2.39:1 (mais conhecido como o aspecto de tela que deixa duas barras na sua televisão por apresentar uma imagem com uma largura maior) serve muito bem à narrativa quando vemos Beto tentando se curvar e se espremer para não ter sua cabeça cortada do enquadramento, principalmente durante as cenas do trabalho, onde sempre parece lidar com pessoas muito mais baixas que ele. Curiosamente, a casa da família Pêra ainda apresenta um pouco das cores e do calor vistos anteriormente, dando a entender que, embora Beto não consegue não ser o Sr. Incrível, estar naquele lugar ainda lhe traz um pouco de conforto. Portanto, quando ele volta à ativa e o filme começar a tomar forma e ritmo, sentimos a volta gradual das cores e da profundidade de campo, mesmo que sem perceber.

Ainda no aspecto técnico do filme, os cenários do filme sozinhos já são um espetáculo. Do escritório apertado da companhia de seguros, passando pelo confortável lar suburbano dos Pêra, às florestas, vulcões e laboratórios secretos de Síndrome, que jamais escapa da combinação entre branco e tons de cinza, salvo a prisão, que até hoje se mantém como um dos meus cenários favoritos por causa do uso da iluminação durante suas cenas, até à casa de Edna Moda, onde tudo é grandioso e carregado de imagens mitológicas (em certo momento ela diz que "costumava criar para deuses", juntando-se a Beto na lista de pessoas que não conseguiram se adaptar ao novo mundo).



Claro, tudo isso seria inútil se não fosse pelo roteiro e direção de Brad Bird, que nunca tenta suavizar as mensagens que quer passar durante o filme, principalmente quando coloca Beto questionando a razão de existir uma cerimônia de formatura ao fim da 4ª série ou até mesmo colocando Helena dizendo para seus filhos, sem amenizar, que aqueles capangas não são como os da televisão e que os mesmos não vão hesitar se tiverem a chance de matá-los. E mesmo assim, o filme consegue balancear com seus momentos cômicos e divertidos para o público mais jovem, como os risos provocados pela estilista Edna Moda ou na divertidíssima sequência onde o jovem Flecha finalmente tem a oportunidade de usar seus poderes.

Além disso, o filme acerta mais numa vez com a criação do vilão Síndrome, que nada mais é um garoto num corpo "adulto" (ponto para o design de personagens, que faz o personagem parecer mais como um garoto do que alguém na faixa dos trinta anos [esse é um chute matemático meu, então já peço desculpas]). O personagem é alguém deseja ser o super-herói que nunca conseguiu ser quando jovem e ao mesmo tempo está disposto a tornar o super em algo banal, o que lembra o diálogo entre Helena e Flecha no começo do filme, onde, após ser mandado a diretoria por usar seus poderes, a mãe diz ao filho que mesmo sem poderes, todos são especiais, o que leva à resposta imediata da criança: "Isso é a mesma coisa que dizer que ninguém é".



E se uma animação bem produzida, que usa os diálogos, personagens e o design de basicamente tudo que é visto em tela não é o suficiente, acrescente a excelente trilha de Michael Giacchino, gravada ignorando o processo digital e juntando uma orquestra numa trilha com fortes influências de Jazz, misturando muito bem a coexistência entre o trivial e o fantástico (como o próprio diretor resume o filme e que fica muito claro ao botar os heróis em situações extremamente rotineiras em momentos fantásticos, como a briga entre Gelado e sua esposa durante o ato final, ou ao colocar Helena se avaliando no espelho do covil do vilão), trazendo o filme para uma escala grandiosa, onde ele merece estar.

Quase onze anos depois, mesmo apresentando alguns sinais de envelhecimento em sua animação (um dos problemas em relação à animação feita por computadores), Os Incríveis acaba sendo um exemplo de como se fazer um filme, não apenas de super-heróis, mas também sobre pessoas e sobre a família, mostrando um carinho completo em cada aspecto que pode ser visto (ou não) em cada quadro do filme, o que virou a marca registrada da Pixar e que está fazendo falta nos últimos trabalhos da casa.

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