Há um pouco mais de um ano, os cinemas lotaram de pessoas com a intenção de assistir à adaptação cinematográfica do best-seller "A Culpa é das Estrelas", de John Green. O livro, que fez o autor cair nas graças do público ao redor do mundo (incluindo eu), também rendeu um filme que deu à Fox Film mais de US$300 milhões. Então, o anúncio da adaptação cinematográfica de mais um livro de Green não foi exatamente uma surpresa. Mesmo que "Cidades de Papel" não acabe fazendo tanto dinheiro quanto Hazel e Gus, o filme ainda consegue ser uma surpresa tão boa quanto.
O filme conta a história de Quentin Jacobsen (Nat Wolff, de "A Culpa é das Estrelas") e sua vizinha Margo Roth Spiegelman (Cara Delevingne, do inédito "Esquadrão Suicida"). Companheiros de brincadeira quando crianças, os dois começaram a se separar ao longo dos anos. Enquanto Quentin seguia seu plano de passar para uma boa faculdade, ter uma carreira, mulher e filhos, Margo conquistou uma reputação lendária para si, claramente virando a rainha do colégio. Por anos, tudo que Q (como Quentin é apelidado) podia fazer era observar sua vizinha/paixão platônica à distância, até a noite em que Margo entra pela janela de seu quarto e o convida para ser o seu ajudante em um plano de vingança.
Com a esperança de que agora as coisas serão diferentes, Q é surpreendido com a notícia de que Margo fugiu de casa mais uma vez. Como a vizinha tem o hábito de deixar pistas sobre os lugares para onde vai, Q, com a ajuda de seus amigos Radar (Justice Smith) e Ben (Austin Abrams), acredita que, dessa vez, as pistas foram deixadas para ele e que é sua missão encontrar Margo Roth Spiegelman.
Mesmo sendo vendido nos trailers como a história de um garoto nerd correndo atrás de sua vizinha incrivel, o resultado final de "Cidades de Papel" é uma história sobre amadurecimento, amizade e a quebra das idealizações. É possível ver aqui um trabalho mais "relaxado" de Scott Neustadter e Michael H. Webber (ambos de "A Culpa é das Estrelas" e "(500) Dias Com Ela"), fazendo adaptações maiores no texto de Green do que o trabalho feito anteriormente. A história continua a mesma, mas coisas foram adicionadas para fazer a história se mover com mais facilidade e ter um desfecho mais fechado que o livro.
Como eu disse, "Cidades de Papel" é sobre a quebra da idealização. A imagem de Margo é lentamente desconstruída ao longo da narrativa. A lenda, a garota incrível, o milagre que mora ao lado não é nada além de uma garota que não sabe quem realmente é e que precisa sempre representar a personagem Margo Roth Spiegelman, a garota que já viajou com um circo, que conseguiu acompanhar bandas em turnês, entre outras histórias. Claro, essa desconstrução não é perfeita, uma vez que Cara Delavine não conseguiu dar vida à personagem completamente, muitas vezes ficando para o roteiro do filme o trabalho de nos apresentar a ideia de que algo mais complicado pudesse estar acontecendo por trás da garota aventureira. Felizmente, o roteiro consegue segurar essa falha do melhor jeito possível, até porque Margo está desaparecida por 60% da trama.
E se Delevingne parece "dura" no papel, o mesmo não pode ser dito do resto do elenco, principalmente do trio formado por Wolff, Smith e Abrams como Q, Radar e Ben. Mesmo que Nat Wolff seja um protagonista carismático e bem sucedido na tarefa de fazer o público embarcar na trama (confesso que fiquei com medo e pena do seu personagem nos momentos finais do filme), a relação entre os três amigos é o que faz o filme ter sucesso em dar suas lições de moral, além de serem responsáveis pelos melhores momentos da projeção, como numa cena em que eles cantam a primeira música que vem à cabeça.
Em termos de estilo, "Cidades de Papel" lembra "A Culpa é das Estrelas" ao repetir a narração em off do protagonista ao longo da trama, algo que talvez vire uma constante nas adaptações dos trabalhos de Green, uma vez que apenas "O Teorema Katherine" não é narrado por seu protagonista. Ao mesmo tempo, esse filme se separa desse estilo ao investir em um visual diferente, em um formato 2.39:1 carregado de tons que dão a ideia de algo dourado em algumas cenas, mas sem saturar a sua paleta de cores, carregando a falsa ideia de perfeição que Q projeta em Margo para o lado visual. O diretor Jake Schreier (do ótimo "Frank e o Robô") comanda a narrativa sem usar os mesmos artifícios já usados em "A Culpa é das Estrelas", onde cada momento de emocional parecia carregar uma faixa da trilha. Aliás, é possível ouvir a trilha instrumental de Ryan Lott mais do que os hits que vão deixá-lo com vontade de comprar o CD da trilha (não que Josh Boone não tenha feito um bom trabalho, mas foi bom não tentarem fazer o mesmo tipo de filme).
"Cidades de Papel" não é o melhor filme do ano (tenho minhas dúvidas até se vai ganhar um MTV Movie Awards) e talvez não seja indicado para todos, mas está cheio de momentos engraçados, personagens carismáticos, atores competentes e com química entre si, referências à cultura pop, uma direção competente e uma história capaz de se conectar com todos que já passaram por uma paixão platônica ou pelo abandono de algumas coisas em prol do amadurecimento.
Nota: 4/5
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